A antiga discussão sobre a redução da maioridade penal

VOCÊ JÁ FORMOU SUA OPINIÃO?

A maioridade penal fixada em 18 anos é definida pelo artigo 228 da Constituição Federal, idade em que, diante da lei, um jovem passa a responder inteiramente por seus atos, como cidadão adulto.

Genericamente, temos, de um lado, aqueles que defendem a redução da maioridade penal. Acreditam que os adolescentes infratores não recebem a punição devida. Para eles, o Estatuto da Criança e do Adolescente é muito tolerante com os infratores e não intimida os que pretendem transgredir a lei. Argumentam que, se a legislação eleitoral considera que o jovem de 16 anos tem o discernimento para votar, deve ter também idade suficiente para responder diante da Justiça por seus crimes.

Por outro lado, aqueles que combatem as mudanças na legislação para reduzir a maioridade penal acreditam que ela não traria resultados na diminuição da violência e só acentuaria a exclusão de parte da população. Além disso, consideram a questão da superlotação do sistema carcerário com os conseqüentes custos para o Estado. Como alternativa, propõem melhorar o sistema socioeducativo dos infratores, investindo em educação. Alguns defendem mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para estabelecer regras mais rígidas. Outros dizem que já faria diferença a aplicação adequada da legislação vigente.

Sem sombra de dúvida a discussão é acalorada e envolve o sentimento de cada um. Envolve até a experiência de cada um.

A Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância, instituição da ONU, cujo objetivo é proteger a vida, promover o desenvolvimento e fazer respeitar os direitos das crianças, produziu em 2005 o “Mapa Mundi da Maioridade Penal”: http://www.brasilacimadetudo.com/wp-content/images/images/mapa_maioridadepenal.jpg

A questão é complexa e prescinde de uma discussão sociológica bastante intensa.

Porém, difícil negar a inércia e a apatia de nossos governantes que se fazendo de espertos, resolvem colocar na pauta de discussão e votação no Congresso Nacional, temas que deveriam ser discutidos com profundidade, mas apenas lá são colocados para amainar a ira das ruas, constatada até pelo mais ferrenho defensor do partido político que reina em nossas terras há mais de uma dúzia de anos. Devemos lembrar que a apresentação da Proposta à Emenda Constitucional (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos tem quase 23 anos. Vinte e três anos! Nasceu, cresceu, atingiu a maioridade – penal e civil e, enquanto isso, nossos ilustres governantes apenas “vendo a banda passar”.

De repente, por força do momento político, fingem querer saber se você é a favor ou contra, quando na verdade apenas pretendem demonstrar que estão apresentando uma “agenda positiva” – expressão muito em moda nos dias de hoje!

Meu caro leitor, você sabia que desde o nascedouro a PEC que discute a redução da maioridade penal utiliza trechos da Bíblia para justificar o projeto?

O texto usa o livro de Ezequiel para explicar que responsabilidade não está ligada à idade. “A certa altura, no Velho Testamento, o profeta Ezequiel nos dá a perfeita dimensão do que seja a responsabilidade pessoal. Não se cogita nem sequer de idade: ‘A alma que pecar, essa morrerá’ (Ez. 18). A partir da capacidade de cometer o erro, de violar a lei, surge a implicação: pode também receber a admoestação proporcional ao delito — o castigo.”

Em seguida, o texto cita Davi. “Ainda referindo-nos a informações bíblicas. Davi, jovem, modesto pastor de ovelhas acusa um potencial admirável com o seu estro de poeta e cantor dedilhando a sua harpa, mas ao mesmo tempo, responsável suficiente para atacar o inimigo do seu rebanho. Quando o povo de Deus estava sendo insultado pelo gigante Golias, comparou-o ao urso e ao leão que matara com suas mãos”.

Por fim, o texto fala do rei Salomão: “Salomão, do alto de sua sabedoria, dizia: ‘Ensina a criança no caminho em que deve andar, e ainda quando for velha não se desviará dele'”.

Considerando que o Brasil é um país laico, interprete da forma que melhor lhe convier. “Vale, vale tudo, Vale o que vier…”, lembrando o síndico, saudoso Tim Maia.

Em recente entrevista ao Portal da Revista Forum, dia 2 de abril último, o jurista Dalmo Dallari afirmou: “o menor de 18 anos condenado criminalmente será obrigado a conviver em um presídio superlotado com criminosos tradicionais, organizados, poderosos. Fatalmente, esse menino de 16 anos acabará sendo coagido a integrar uma quadrilha. Por isso, a proposta, além de não ser constitucionalmente aceitável, é socialmente prejudicial para o povo brasileiro, porque vai forçar meninos de 16 anos a ficarem à mercê de criminosos já amadurecidos”.

Em contrapartida, não podemos negar que a escola do crime se inicia do lado de fora dos presídios, a coação para levar o indivíduo a “integrar uma quadrilha” também pode começar nas ruas.

É fato que “criminosos já amadurecidos”, organizados e poderosos, existem as pencas aqui fora também.

Nas comunidades mais violentas, menores também convivem com o crime organizado e nossa estrutura social lamentavelmente não os socorre.

A questão da oferta de possibilidades para que o menor integre o mundo do crime se verifica nas duas frentes, tanto nas ruas como nos presídios.

A sensação que temos é que esta discussão jamais terá fim. Futebol, religião, sexo, maioridade penal, pena de morte, são questões polêmicas e dotadas de impressões e opiniões das mais diversas que jamais serão uma unanimidade.

É curioso verificar as acaloradas discussões que ocorrem em tempos de pressão política. Os mais prudentes argumentam que nada deve ser resolvido nestas condições. Estes, onde estavam durante o longo tempo em que a PEC ficou esquecida? Devemos ter cuidado. E muito. Quem de nós já não pensou a respeito? Isso não pode ser subestimado sob o argumento de que o tema não está suficientemente debatido. Nunca estará.

A cada momento novas ideias, novos pensamentos surgem em razão de informações que nos são trazidas. Você sabia que no Uruguai, no início de março deste ano, uma mãe de 50 anos de idade foi presa por não cuidar bem do filho menor que, como integrante de um bando de menores de 12 a 16 anos, apedrejavam veículos e cometiam pequenos furtos no bairro de Maroñas em Montevidéu?

Alguns magistrados do país vizinho classificaram a medida como “exemplar”. Vejam que a punição é sobre as mães e não sobre os pais. Segundo um Juiz, a escolha das mulheres “é acertada” porque é importante levar em conta que os “menores são muito ligados às mães”. E continuou a inacreditável decisão: “Se eles virem que começam a prender sua mãe, algo pode mudar” (fonte: Tribuna do Direito, abril de 2015, p. 7).

Nos dias de hoje, difícil negar que com 16 anos de idade qualquer de nós sabe distinguir o certo do errado, o bem do mal, o legal do ilegal. Devemos abandonar a demagogia e aprimorar a Educação, independente da aprovação da PEC. Sem isso não iremos avançar.

Ou então, vamos fazer como nossos vizinhos dos pampas e colocar as mães no xilindró, jogando o problema para baixo do tapete. Aliás, que tal fazermos uma enquete para saber quais os políticos que ainda têm mãe com vida? Quem sabe se com elas no cárcere eles se tornarão cidadãos de bem?

RODNEY CARVALHO DE OLIVEIRA